É O QUE TEMOS PARA HOJE

RANULFO PARANHOS – CIENTISTA POLÍTICO E PROF. DR. DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS

Antes mesmo de passada a turbulência da votação do processo de impeachment no Senado Federal, com 55 votos favoráveis ao afastamento contra 22 votos em favor de Dilma Rousseff, as redes sociais já lançavam dúvidas sobre a legitimidade de Michel Temer (PMDB) assumir ou não o cargo de Presidente. Gostaria de advertir ao leitor que esse artigo não é em defesa do Presidente interino Temer. Mas me arrisco a tentar jogar água fria em discursos de botequins e rodas de cafezinhos – indispensáveis à discussão política.

O principal argumento dos defensores de Dilma é que Temer não recebeu votos do povo e por isso não tem o direito de ocupar a cadeira de Presidente. Essa tese parece frágil e os defensores do impeachment rebatem com veemência: na urna eletrônica aparecia a foto do Temer junto com Dilma. Foram eleitos como uma chapa. Há ainda aqueles que vão além: se Temer era um zero à esquerda, por que não escolheram o Waldir Maranhão como vice de Dilma?

Os defensores de Dilma rebatem: não tem legitimidade porque é um golpista. Aí cabe lembrar que tudo o que está acontecendo faz parte da regra do jogo (isso mesmo, política é um jogo). Quando o titular é afastado, na linha sucessória alguém tem que assumir a vaga. Nesse caso, Temer é o primeiro dessa linha. E quanto ao fato de ser golpista, necessariamente, quem afastou Dilma não foi Temer, mas 367 deputados federais e 55 senadores. Ou seja, Temer pode e deve ter conspirado, mas não tem direito a voz e voto nas duas casas que compõem o Congresso Nacional.

Mas essa discussão parece não ter fim. Descamba para o campo ético e moral, avança para culpar as regras eleitorais, em seguida acusa a Justiça, mais tarde entra na pauta a possível vingança do Eduardo Cunha (PMDB/RJ), depois estende-se pela Economia, desemprego, programas sociais, honestidade, responsabilidade, ausência de crime… pronto, inviabilizada a discussão por excesso e confusão de argumentos.

Gostaria de lembrar que segundo as regras eleitorais do nosso sistema representativo, o povo elege deputados e senadores e os autoriza a tomar decisão em seu nome. Trocando em miúdos, o povo dá legitimidade a esses senhores(as) para representarem seus interesses. Pasmem ou não, o povo no poder são os 513 da Câmara dos Deputados, dos quais 367 votou pelo impeachment de Dilma Rousseff. Esses deputados “golpistas”, representam 71,53% daquela casa legislativa e somam 42.675.163 votos, distribuídos em 23 partidos políticos. Adicione a isso 55 senadores de 14 partidos, que perfazem 109.764.590 votos.

Ao que parece, para tirar a legitimidade de Temer ou o próprio Temer do trono de ferro da República, é preciso primeiro deslegitimar representantes de uma bagatela de mais de 150 milhões de votos, quase três vezes mais que os 54 milhões de votos obtidos pela chapa Dilma/ Temer nas Eleições de 2014.

 

Disponível em : Gazeta Web